Consultoria de imagem e estilo não é sobre moda, acho que toda profissional da área concorda com isso. Ao mesmo tempo, nosso trabalho envolve o guarda-roupa e o vestir da cliente.

É aí que a moda dá as caras, porém de um jeito bem menos óbvio. Tanto como ferramenta para ajudar a cliente com seu estilo pessoal, quanto para renovar e ampliar nosso próprio repertório.

A roupa é um objeto tangível da nossa cultura. Se você criar uma linha do tempo dos últimos 100 anos, por exemplo, vai estabelecer as conexões entre vestuário e profundas mudanças sociais, econômicas, políticas e de valores de determinada época.

Eu adoro moda e acompanho com muito interesse as semanas de lançamento. Aqui e do mundo. Conferi nos últimos dias as coleções de inverno 2023 de Milão e de Paris, que terminou em 07 de março.

Vá além das tendências

Meu interesse pelos desfiles vai além de tendências, me ajuda a renovar o repertório, a observar o que estilistas e designers estão propondo com suas cores, shapes, tecidos, texturas. Tem a questão estética, a expertise do corte, do acabamento, do movimento da roupa.

A Hèrmes, por exemplo, renovou meu olhar. Quando uma harmonia total + rigor monocromático se encontram, sem cair no óbvio, é puro deleite para os amantes de moda, estilo e imagem pessoal. Uma coleção e um desfile que merecem ser estudados em termos de cores, cartela cromática, styling.

As cores e o styling monocromático dos looks na passarela valorizaram essa coleção primorosa. Olha só: os tons naturais dos cabelos inspiraram a cartela cromática!

Tem também a narrativa do momento atual, que faz parte do que estamos vivendo na cultura, no comportamento, no jeito ser, estar e ver o mundo.

  • Ou seja, as roupas são um eco da história recente e o que expressamos e comunicamos com nosso vestir.
  • Um bom exemplo é a bolsa 2.55 de Coco Chanel, lançada em 1955.
  • Um modelo ‘tiracolo’ para a mulher usar no ombro, que foi tanto uma declaração estética, quanto de comportamento.
  • As mulheres tinham mais o que fazer com as mãos além de carregar uma bela bolsa. Trabalhar, participar do mundo, ser dona do próprio nariz.

CONSIDERE QUE…

  • Hoje não existe mais aquela coisa de tendência X, Y, Z. Ao contrário!
  • Ficou datada a hierarquia de 10, 15 anos atrás, quando grifes, estilistas e a mídia ‘decidiam’ o que cada pessoa deveria vestir. Quais cores, modelagens, como usar o look da “moda” com os acessórios, sapatos e bolsas “certos’.
  • O que vejo nas semanas de moda, coleções e looks que gosto são inspirações, não um roteiro a ser seguido.
  • Movimentam meu senso estético e minhas questões de vestir, pois pouca gente pode se dar ao luxo de ter um guarda-roupa grifado. E quem pode, tem cuidado para não se tornar vítima da moda.

Chanel

A camélia faz parte da assinatura Chanel e foi protagonista do inverno 2023. Virginie Viard, assim como Lagerfeld em diversas coleções, reverencia a estilista e um de seus símbolos. A novidade, nesta coleção, é que a flor aparece de todas as formas possíveis: em couro preto na lapela de um casaco; brancas e aplicadas no suéter e camiseta; no tubinho curto Op Art, estilizada nas estampas de vestidos saias, blusas, bermudas; jaquetas e tailleurs. Assim como apareceu nos acessórios e nas meias rendadas, o que remete à juventude e ao início de Coco Chanel na moda. Em 1913 ela foi fotografada com uma camélia presa ao cinto e desde 1924 a flor aparecia em suas coleções.

Dior

Maria Grazia Chiuri na Christian Diorfoi aos anos 50 e fez sua leitura de peças símbolos da marca. Saias e vestidos em tecidos com fio de inox, que cria efeito de relevo, tirando a rigídez da modelagem. Tudo parece fácil de usar – básicos sem nada de banal.

Hèrmes

Tons e gamas de vermelho, marrom, avelã, amarelos e pretos do inverno 2023 da Hèrmes vêm de uma referência pouco usual na definição da cartela: as cores naturais dos cabelos. A designer Nadège Vanhee-Cybulski explicou que pensou no poder dos cabelos ao começar a desenhar a nova coleção.

“Cabelo é sobre identidade. É um forte atributo feminino, e você pode ser homem ou mulher e seu cabelo pode expressar seu lado bonito” (Nadège Vanhee-Cybulskim, Hèrmes)

“Poder, sedução e magia”

Para a estilista Nadège Vanhee-Cybulski o cabelo, ao longo da história humana, simbolizou, além de poder, sedução e magia. O rigor dos looks monocromáticos da passarela reforçam essa ideia com uma espécie de austeridade suave.

E se a cartela teve como ponto de partida a cor das madeixas, o styling de muitos looks foram permeados de sutileza, que apareceu algumas vezes nos contratrastes e subtons entre a roupa e o cabelo das modelos. Isso sem perder o efeito monocromático do conjunto.

Vanhee-Cybulski, ao se inspirar na cor dos cabelos, criou trançados para tricôs e trabalhou malhas metálicas onduladas, que brilham com os movimentos. “Cabelo para trás, cabelo para frente, nada nas laterais, coque, trança, cada capítulo é uma cor de cabelo”, disse.

Boa parte do desfile Hèrmes foi dos vestidos metálicos plissados, reverenciando a alta costura de Vionnet e Paul Poiret dos anos 1920. Pra mim, obra de arte de vestir entre as criações de Nadège Vanhee-Cybulski nesta coleção.

Sacai

Chitose Abe é uma estilista que domina a alfaiataria de um jeito nada convencional. Suas roupas têm elementos utilitários com cortes e construções complexos e isso está explícito no seu inverno 2023 da Sacai. O efeito na roupa remete a designs detalhados e sem excessos: o que “enfeita” são os recortes, pregas, nervuras, transparências discretas em camisas e tops. Peças que lembram que as mulheres são ao mesmo tempo cerebrais e “femininas”. Só que um feminino diferente, que dispensa super ombreiras e salto agulha para expressar poder.

Stella McCartney

O guarda-roupa e os códigos de vestimenta equestre britânicos foram a base da coleção Stella McCartney. A estilista contou que se reapropriou desses códigos para apresentar uma alfaitaria com saias, paletós, blazers e casacos com estrutura superdimensionada, peças em xadrês, tricô, vestidos estruturados em cortes com movimento. Cinza, preto, camelô e vermelho dominam a cartela, enquanto a designer mantém seus próprios códigos de criação. Ou seja, uso de materiais sustentáveis e suas pesquisas de alternativa ao couro animal. É disso que se trata e vai além da moda, apesar de pouco sabermos de onde vêm e como são produzidas as roupas que compramos.

Alexander McQueen

Sarah Burton sabe cortar e trabalhar tecidos, maestria presente em cada peça Alexander McQueen. O primor da alfaiataria, inspirada no filme “Tar”, está nos ternos, calças, camisas, casacos. E o ‘espírito indomável’ da marca nos vestidos.

Ester Manas

Ester Manas é a passarela mais inclusiva de Paris. A marca de Ester e Balthazar Delepierre, parceiro de vida e de moda, tem 3 anos: a dupla cria roupas para durar, que se adptam às mudanças do corpo. 90% da coleção é feita com estoque morto, tem muita seda, malha canelada, expertise na modelagem e no acabamento.

Max Mara

Dos tons de areia, camelo, marrom, cinza, preto ao verde e rosados + lã fria, pelúcia, nylon tecnológico, couro. Ian Griffiths revisitou peças masculinas do século 18 para a Mara Max. Sua referência foi a cientista Émilie du Châtelet, nascida em 1706. Amei!

Dries Van Norten

O inverno 2023 de Dries Van Norten tem foco em tecidos, colagens e seda pintada à mão, delicados chiffons em saias e vestidos. Ternos e tailleur estruturados e com movimento. Ele propõe roupas que durem, que sejam ‘amadas’ e ganhem nova vida com o tempo.

Ferragamo

Alfaiataria, vestidos que remetem a estrelas do cinema da década de 50 com elementos contemporâneos ou detalhes de roupas esportivas na coleção Ferragamo, a segunda do jovem estilista Maximilian Davis. Uma lufada de ar fresco na grife italiana.

Saint Laurent

Anthony Vaccarello fez uma ode aos anos 80 na Saint Laurent, retomando o conceito do poder do paletó com super ombreiras + saia lápis bem justa + salto agulha. Criou impacto e foi ovacionado ao final do desfile. Uma alfataria considerada sexy, arrojada e contemporânea. Sou mais os vestidos, saias e tops ajustados. Haja poder!

Dolce & Gabbana

Domenico Dolce é um mestre em alfaitaria e a Dolce & Gabbana traz sempre ternos, tailleurs e casacos que beiram a perfeição. Na coleção, essas peças estão lá, junto com vestidos sensuais, sedas e transparências. Para durar muito e usar sempre.

Miriam Lima

Miriam Lima

“Luto por um mundo mais justo e humano e ensinei isto a meus filhos. Determinação e persistência são características das quais me orgulho. Acredito que as mulheres são várias, mas também únicas, daí que dedico meu trabalho a cada uma delas e como todas nós algumas vezes ‘enlouqueço’ com as dinâmicas da vida. Escrever neste espaço sobre imagem pessoal, inconsciente, estilo, comportamento, humanidades me enche de alegria” PS – “LEVEI UMA VIDA PARA ME SENTIR BEM NA PRÓPRIA PELE”

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