O mundo virou pelo avesso. E nós fomos revirados por dentro pela pandemia. Revirados em nosso interno, em nossas certezas e no suposto controle sobre o correr da vida, enquanto atravessamos uma jornada para a qual ninguém estava devidamente preparado. Nem sociedade, nem governos. Embora os cientistas, desde o início deste século, já alertassem para o aparecimento de um novo vírus, altamente contagioso. Não existia o ‘se’, mas o ‘quando’, segundo destacados epidemiologistas, médicos, estudiosos. Mas aqui estamos, em uma dura travessia pelo planeta Terra, emoções e sentimentos à flor da pele. E esperando que a ciência nos resgate deste inimigo microscópico, que espalha doença, enluta famílias, ameaça os sistemas de saúde, assola a economia, afeta nossa saúde mental.
A preocupação com a saúde mental ganhou tal relevância e atenção na pandemia, que nunca, na história recente, pesquisou-se tanto sobre transtornos psíquicos e psiquiátricos. Segundo o Google, em 2020, das principais buscas de ‘como lidar’, duas estão relacionadas a depressão e ansiedade. Pesquisa recente da Mastercard revelou que 60% dos entrevistados consideram essencial investir hoje na saúde mental em comparação com antes da pandemia. Já um levantamento da Workana, plataforma que conecta freelancers a empresas da América Latina, mostrou que as mulheres são as mais afetadas pelo home office – 28% delas revelaram sintomas de ansiedade e, no geral, a maioria dos entrevistados (43%) sentiu que a saúde mental foi afetada.
Importante observar que saúde mental não é sobre doença, mas sobre como lidamos com nossas emoções – alegria, satisfação, tristeza, raiva, frustração. A forma como reagimos a determinadas situações, circunstâncias, problemas, mudanças e desafios determinam a qualidade da nossa saúde mental. Neste ano pandêmico, em que se instalou certo mal-estar coletivo, cada pessoa vivencia e reage ao estresse, dificuldades e conflitos de um jeito único.
Como a pandemia está nos impactando e aos nossos clientes?
A pandemia nos deixa sob pressão, exacerbando dificuldades que, para muita gente, até então estavam debaixo do tapete. Não à toa, veículos de mídia publicam tantas reportagens, artigos e pesquisas relacionando os efeitos da pandemia na saúde mental, enquanto empresas e empregadores cada vez mais levam o tema para suas agendas.
Da mesma forma, profissionais liberais, empreendedores e prestadores de serviços terão de lidar com suas próprias dificuldades e entraves emocionais, tentando entender como a pandemia está impactando e afetando seus clientes e consumidores. Que estão e continuarão mais fragilizados, como todos nós, e possivelmente mais exigentes e seletivos, revendo o que é importante e o que passa a ser supérfluo. Agora e em futuro próximo.
Não dá para entender as mudanças de comportamento das pessoas sem entender as mudanças que estão acontecendo no mundo e quais os modelos de sociedade e cultura vão emergir na pós-pandemia. Nosso jeito de viver, trabalhar, nos relacionar, nos vestir e consumir serão realmente alterados? O coronavírus, como atestam os futuristas, tornou-se também um acelerador do futuro, antecipando mudanças que só se consolidariam ao longo dos próximos anos – telemedicina, ensino à distância, home office. Mas como vamos estar e nos sentir quando as vacinas nos libertarem desse vírus?
PENSE SOBRE ISSO
- Para vários estudiosos, entre cientistas, pesquisadores, profissionais psi, estamos lidando com uma segunda ameaça, e de longo prazo: a saúde mental em declínio.
- Pesquisas e estudos já mostram que a Covid-19 embute uma espécie de segunda epidemia ao provocar e aumentar os casos de ansiedade, estresse, depressão, que vai se estender por meses ou até anos a fio, afetando pessoas de todas as idades, classes sociais, profissões, renda.
- O medo de ser contagiado, ou alguém próximo, o confinamento, a solidão, a preocupação com a sobrevivência e à própria exposição ao vírus criam um ambiente de tensão crescente.
- Mas a pandemia, que causa tanto medo, incertezas e devasta vidas, pode contribuir para reduzir preconceitos, estigmas e tabus, ainda tão enraizados em nossa cultura, que cercam ansiedade e depressão, por exemplo, duas das doenças que mais atingem os brasileiros.
- Psicanalistas e psiquiatras alertam ainda para o autoestigma em relação aos sofrimentos mentais, impedindo a busca de ajuda especializada, criando um círculo vicioso de desinformação e de adoecimento mental.
Como investir em uma prática genuinamente humanizada?
São nestes tempos, estranhos e atípicos, em que nos defrontamos individualmente e coletivamente com nossa finitude, que o profissional da consultoria de imagem pode auxiliar clientes pessoais e corporativos na gestão de imagem e marca pessoal. Nós operamos no campo da aparência, do comportamento e da comunicação verbal/ não verbal. Operamos no campo do humano, com as singularidades, histórias de vida, dificuldades, demandas e expectativas de cada pessoa. Essa lida já exige, por si só, entender profundamente o cliente, e agora, mais do que nunca, considerarmos a importância da saúde mental no processo de atendimento.
Como lidar com essa questão delicada e complexa, operando nos limites de nosso trabalho? Consideramos essencial investir em uma prática genuinamente humanizada, que atenda às reais necessidades de nosso cliente e de suas demandas de imagem, afetadas diretamente por estressores emocionais, que podem ser ampliados pela pandemia.
Qual a relevância dos cuidados com a imagem e com o estilo pessoal diante de um cenário tão assustador? Para especialistas ouvidos pelo jornal O Estado de São Paulo na série ‘entre a mente e o corpo’, cuidados com aparência, beleza e imagem podem ser um ponto de sustentação da autoestima, quando as estruturas psíquicas estão tão abaladas, incluindo a autoimagem. “O estilo é um modo de definir a existência para si, mesmo levando em conta o olhar do outro”, disse o psicanalista e psiquiatra baiano Marcelo Veras, quando perguntado na reportagem se cuidar da beleza pode ajudar a melhorar a autoestima neste momento.
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Lembro e destaco que o trabalho do consultor de imagem, que tem por objetivo ajudar o cliente a comunicar quem ele é de uma forma autêntica, nada tem a ver com o trabalho de um psicólogo, por exemplo.
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Acredito que uma consultoria bem conduzida de imagem e marca pessoal pode ser uma ferramenta importantíssima, ajudando também o cliente que vivencia um momento de fragilidade ou até mesmo um transtorno emocional.
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Não serão poucas as pessoas, por exemplo, que vão demandar os serviços da consultoria de imagem para uma transição de carreira, seja em busca de propósito e satisfação profissional, seja por exigência do mercado.
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A pesquisa Global Learner Survey, realizada em sete países, revelou que 76% dos brasileiros entrevistados consideram que a crise do coronavírus os fez repensar suas trajetórias profissionais.
Inovação na consultoria de imagem envolve nossas habilidades humanas
A pandemia nos afeta coletivamente, em diferentes gradações e dificuldades, mas a forma como cada pessoa vivencia suas dificuldades, inclusive de imagem, sempre é no singular. Lembro que a percepção de imagem, ou a autoimagem, tende a ficar exacerbada, e quando negativa vai afetar mais ainda a vida da pessoa. Por isso, profissionais da consultoria de imagem devem redobrar sua atenção a fim de que o trabalho, em vez de ajudar, não piore a vida do cliente, criando um nível inalcançável de ideal estéticos, o que pode comprometer a saúde mental da pessoa que atendemos, causando mais sofrimento.
Nossas escolhas de imagem têm causas também inconscientes, o que significa que desconhecemos a origem de muitas dessas escolhas. Mais um motivo para estarmos atentos. Acreditamos, agora e na pós-pandemia, que inovar e nos qualificar cada vez mais, indo além da expertise das técnicas, é fundamental.
Inovação na consultoria de imagem tem a ver com pessoas e o desenvolvimento de nossas habilidades humanas. Mais do que nunca serão valorizadas a criatividade, o pensamento crítico e reflexivo, e sobretudo o autoconhecimento. Nosso trabalho pode e deve gerar benefícios. Mas sem nos responsabilizarmos pela forma como conduzimos o processo isso não é possível.
Este é o segundo artigo, escrito a quatro mãos com minha colega Cris Dorini, consultora de imagem profissional e marca pessoal. Reflexões que são fruto de nossas conversas sobre saúde mental, pandemia, o mundo pós-pandemia e o quanto isso afeta, entre outras coisas, nossa imagem pessoal. Se este tema é do seu interesse, temos outros dois textos publicados no Linkedin, que podem ajudar, e muito, nas questões que envolvem o profissional de imagem e a saúde mental neste momento tão impactante na vida de todos nós.