O que o armário esconde e revela? Em minha experiência na lida com o cliente já me deparei com o que a princípio seria um impedimento para fluir o processo de consultoria de imagem. Uma cliente se recusou a abrir seu guarda-roupa, quando expliquei que a visita ao closet fazia parte do processo. “Você precisa mesmo ver meu guarda-roupa?”, ela questionou. Percebi de cara seu desconforto. Abrir o armário é abrir um pouco a vida da gente, há pedaços de nossas histórias ali dentro. Pensei. E agora? Como conduzir o processo?
No meu método de trabalho, eu sigo o fluxo do cliente. Para isso, voltei uma casa a fim de encontrar um jeito de fazer daquela recusa um canal de comunicação. Convidei a cliente a falar de seu armário, descrever o que ela gostava, o que não gostava, se tinha peças que eram especiais e faziam parte de suas memórias afetivas. Nos encontros, que foram desdobrados, minha cliente conseguiu contar várias coisas de sua vida, resgatou lembranças, inclusive de seu relacionamento com a mãe.
Ao não forçar a cliente, entendendo que naquele momento sua recusa era um limite e um ponto vulnerável, consegui que ela falasse de algumas de suas dificuldades com aparência e autoimagem. Dificuldades que podem estar relacionadas a compulsão por compras, tão recorrente hoje, e que será tema de novos artigos que você, consultora de imagem, vai ler aqui no blog. Minha cliente me contou, então já à vontade, que seu armário estava repleto de peças que não usava, muitas delas ainda com as etiquetas. E põe etiquetas nisso! Ela vivia entre a alegria momentânea da compra e depois tinha de ser haver com a insatisfação que voltava a rondar sua vida.
PENSE SOBRE ISSO
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Trabalhar com as dificuldades colocadas pelo cliente é lidar com suas singularidades e nos haver com imprevistos. É sair do script e ir além das técnicas, dos manuais e dos questionários padronizados
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A escuta deve ser entendida e praticada como uma ferramenta humanizada para nos conectar ao cliente e entendê-lo mais profundamente. O que os olhos não veem nossa escuta alcança
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Não está na hora de desconstruir um modelo de trabalho com etapas rígidas e humanizar mais nossos processos de atendimento na consultoria de imagem?
Siga sempre a trilha do cliente, até nas dificuldades que surgem
Depois de alguns encontros, a cliente me convidou para conhecer o seu armário. O número maior de entrevistas, e minha escuta atenta, sem interferências e julgamentos, a ajudaram a desatar alguns nós. Pude então conduzir uma consultoria de imagem com ótimo resultado, iniciada de cara com um problema.
Não devemos nos prender a problemas, mas aprender a lidar com eles. Sigo a trilha do cliente, seja com as facilidade que ele oferece, seja com as dificuldades que surgem. A meu ver, o que difere um bom consultor é ele estar aberto aos movimentos do cliente, pois na maioria das vezes nos deparamos com pedras pelo caminho. Às vezes o cliente nos oferece um material imprevisível, mas até por isso, também muito rico.
Por trás da roupa tem sempre uma história de vida
Por trás da roupa, do armário, tem sempre uma história de vida. Não precisamos seguir as técnicas ao pé da letra, tendo em vista que cada cliente é único e se comporta de um jeito único. Esse atendimento teve vários aprendizados e desdobramentos interessantes e compartilho com vocês, colegas consultoras de imagem, dois deles.
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PRECIPITAR, JAMAIS!
Como atender as demandas e expectativas da minha cliente, sem saber também de suas roupas, acessórios, calçados, o que usava e o que não usava, peças prediletas e tantas outras informações? Diante dessa situação, muitos profissionais concluiriam que a cliente não queria de fato fazer uma consultoria ao se recusar a mostrar seu armário. Mas não devemos concluir nada precipitadamente e considerar logo de saída que a consultoria está inviabilizada.
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VULNERABILIDADES DO CLIENTE X ALCANCE DA ESCUTA
Muitas vezes o cliente não tem ideia de suas dificuldades de autoimagem e o consultor de imagem pode ajudá-lo a desfazer alguns nós. De cara me vi diante de uma vulnerabilidade e pensei como tirar o melhor proveito disso. Se tem algo que pode ajudar nosso trabalho é tirar o melhor proveito, no bom sentido, da vulnerabilidade do cliente. Algo tão difícil inicialmente tornou-se um facilitador e abriu possibilidades de conexão com a cliente. Ao escutar minha cliente eu a levava a se questionar sobre alguns pontos cegos e entraves com a sua aparência.
Acompanhe a fala, o tempo e o ritmo de seu cliente
Será que nesse mundo tecnológico, que está pedindo humanização, não está na hora da gente desconstruir um pouco esse modelo de etapa 1, etapa 2, etapa 3? Não que a gente não tenha de fazê-las, mas acredito em conduzir essas etapas de acordo com cada cliente. Eu não adoto modelos rígidos, não acredito que eles sejam efetivos para personalizar nosso atendimento e desenvolver uma expressão visual autêntica para nosso cliente. Com essa cliente consegui fazer todos os passos da consultoria, respeitando o tempo dela, que ficou muito satisfeita com o resultado.
Aprendi a não impor meu ritmo ao cliente ou ter tudo pré-determinado. Por isso só aplico um questionário para me informar sobre o estilo de vida da cliente após uma série de entrevistas e encontros com ela. O tempo todo nós lidamos com questões do cliente, muitas vezes, desconhecidas por ele mesmo.
Trabalhamos com o que o cliente oferece. Ou seja, com os limites dele. Minha experiência na consultoria de imagem me ensinou que não existe situação ideal, nem solução ideal. Tampouco cliente ideal ou consultor de imagem ideal. Quem atende e está atento a um trabalho humanizado acompanha a fala, o tempo e o ritmo do cliente. São as dores e as delícias do nosso ofício!