O mundo está clamando por diversidade, quebra de padrões, exaltando a beleza da imperfeição. Imperfeição que vem de nossa humanidade, de cessar uma busca enlouquecida por imagens idealizadas, de nos gostarmos sem precisar do nariz da moda, da boca da moda, do rosto da moda, do corpo da moda. A “imperfeição”, entre aspas, celebrada, humanizada, consentida.E como nós, consultores de imagem, estamos nos preparando para lidar com essa bem-vinda quebra de paradigmas?
A consultoria de imagem, que foi construída para adequar o cliente a padrões de imagem, vai precisar rever seus fundamentos, enunciados e normas. Nós precisamos adentrar e nos movimentar na pluralidade de corpos, de rostos, de cabelos, de raças, de idades. Fato é que passamos hoje por mudanças sociais, culturais e de comportamento de toda espécie. A consultoria de imagem, que chegou no Brasil há 40 anos, deve se preparar para as novas linguagens, as novas narrativas, adequando-se ao novo mundo e ao futuro, que de certa forma foi acelerado pela pandemia.
Essas são algumas das reflexões e questionamentos que fiz na apresentação do tema “Consultoria de Imagem Além das Técnicas: como Entender o Cliente” no Fipi Brazil Inspiring (*), quando falei também dos cenários pós-pandemia e seus impactos no trabalho do consultor de imagem. Na primeira parte deste artigo – O ANTES, O AGORA E O DEPOIS: COMO VAMOS NOS DIFERENCIAR? abordo a importância dos profissionais de nossa área investirem cada vez mais na humanização dos processos de atendimento. Para isso, desenvolver a criatividade e o pensamento crítico e reflexivo é essencial para nos diferenciar no mercado. Habilidades que se perdem se não investirmos no nosso próprio autoconhecimento.
A indústria da moda está dando seus pulinhos e tem se movimentado em prol da quebra de padrões. Bem verdade que tudo está ainda muito no início. Mas são bons indícios. Vale lembrar o impacto que a marca italiana Versace causou dois meses atrás, quando incluiu pela primeira vez em sua passarela modelos negras, modelos de etnias diversas, modelos de cabelos crespos, modelos plus size.
Por aqui, a última edição do SPFW foi também emblemática. A semana de moda paulista formalizou algo inédito na história da moda mundial, que foi a obrigatoriedade de as marcas participantes escalarem um casting com 50% de modelos negros, afrodescendentes ou indígenas. Decisão consolidada graças ao trabalho do coletivo Pretos na Moda, que levou para a organização do evento a pauta pela diversidade étnica e de corpos.
A pluralidade é o nosso oxigênio para uma nova cultura
Na indústria da moda, e na mídia, a cultura em prol da pluralidade, da diversidade e da inclusão, apesar de ainda inicial, parecer ser um caminho sem volta e a diversidade é uma espécie de oxigênio que nos manterá vivos. A beleza da imperfeição, que agora está nas revistas, deve estar também no nosso olhar, que precisa se tornar menos viciado por padrões e rótulos de imagem.
Se o mundo será cada vez mais diverso, plural e inclusivo, o consultor de imagem precisa entender o cliente além dos ditos padrões e modelos até hoje vigentes. Precisamos entender a cliente gorda, a cliente velha, a cliente preta, a cliente trans e tantas outras. Sabemos, tecnicamente, que corpos em formatos X, Y ou Z se adequam a determinadas modelagens. Mas isso adianta pouco se não entendemos o universo da cliente, suas dores e as expectativas que ela tem ao contratar uma consultoria de imagem.
Questione-se sempre sobre seu trabalho e como você o conduz
Além de dominar a comunicação de imagem, os códigos de vestir e etc, precisamos entender quais são os possíveis entraves do cliente com seu corpo, seu rosto, sua imagem. Para isso, precisamos nos perguntar e questionar sobre nosso trabalho e como o conduzimos.
1
Será que estamos acompanhando o movimento do mundo, que se volta cada vez mais para a cultura da diversidade e da representatividade?
2
Estamos dispostos a abraçar as diferenças, a rever e a questionar padrões de estética e de corpo?
3
Estamos nos perguntado, cotidianamente, o que cada cliente quer da consultoria?
4
Não está na hora de nos voltarmos ainda mais para o bem-estar da nossa cliente?
5
A cliente quer mesmo que seu corpo seja corrigido, mapeado, configurado para parecer mais magro ou mais jovem?
6
A nossa cliente quer realmente roupas que disfarcem o que se convencionou chamar de defeitos, ante ideais de beleza inalcançáveis? Ou ela quer se sentir bem na própria pele, se sentir bonita do jeito que ela é?
Cada pessoa lê o mundo conforme sua partitura interna
Precisamos estar atentos a essas questões para não colaborar com o adoecimento ou a fragilização emocional da cliente, já que o terreno que envolve a autoimagem é delicado e complexo. Recebi muitas mensagens quando publiquei no Linkedin o artigo OS QUERERES DA ERA DIGITAL, abordando os danos emocionais que a padronização da beleza pode causar nas pessoas.
No texto, fiz algumas reflexões sobre como precisamos estar atentos para evitar as armadilhas de padrões e fórmulas. Pessoas são únicas e o ideal de felicidade e bem estar do outro nem sempre nos serve. O que é bom para mim, não necessariamente é bom para uma outra pessoa. Tenho sempre em mente que cada pessoa, e cada cliente, lê o mundo conforme sua partitura interna.
Na pós-pandemia, possivelmente vamos lidar com um cliente mais fragilizado, como todos nós, e mais exigente em suas demandas, como expliquei na primeira parte dessas reflexões. Então, não vai dar para o consultor de imagem trabalhar e entender o cliente sem se voltar para o interno.
A pandemia está ensinando, mais do que nunca, a necessidade de olharmos para dentro. Os consultores de imagem mais bem sucedidos serão aqueles com amplo conhecimento técnico, mas também aqueles que consigam estabelecer relações humanizadas com seus clientes, criando e propondo narrativas visuais e de imagem autêntica para eles, e se responsabilizando por todo o processo. Do início ao fim.
E como a gente vai se reinventar? Deixe que seu cliente conte como ele se vê. Vá muito além do que os olhos alcançam, muito além da aparência que o cliente mostra. Desconstrua certezas. Não é hora para ter certezas. Mas é hora de apostar. A minha aposta é no interno. E a sua? Tenho escutado cada vez mais o meu lado de dentro, meu avesso, minha roupa interna, minha alma.
(*) O Fipi Brazil Inspiring aconteceu em 14/11/2020, em edição virtual. No evento promovido pela FIPI, da qual sou representante em Minas Gerais, foram abordados diversas questões em várias mesas temáticas. Apresentei na minha mesa o tema “Consultoria de Imagem Além das Técnicas: Como Entender o Cliente”. Assunto em que levei ideias e perspectivas que atravessam a prática de meu trabalhoartir desta temática comum, que atravessa a prática do nosso trabalho
“CONSULTORIA DE IMAGEM ALÉM DAS TÉCNICAS: COMO ENTENDER O CLIENTE”
GOSTOU? LEIA TAMBÉM O ‘ARTIGO O ANTES, O AGORA E O DEPOIS: COMO VAMOS NOS DIFERENCIAR?‘