O tema da saúde mental saiu do armário, entrando no radar da mídia e do mundo do trabalho, especialmente com a pandemia. Mesmo assim, a atleta Simone Biles, 24 anos, ao falar cruamente de suas dores e vulnerabilidades, deixou o mundo perplexo. A melhor ginasta do mundo, que se retirou de quatro finais das Olimpíadas de Tóquio, tornou ainda mais central essa discussão. Por mais que outros “deuses e deusas do Olimpo”, antes dela, já tivessem admitido problemas emocionais e desajustes, a coragem da norte-americana rompeu com o mito da heroína imbatível, imune ao sofrimento psíquico e à depressão.
- O que essa questão tão delicada tem a ver com a consultoria de imagem?
- Quais aprendizados desse caso se aplicam ao nosso trabalho e práticas de atendimento?
“As Olímpiadas não foram como eu esperava, mas colocar a minha saúde mental e física como prioridade será uma dos meus maiores feitos”, disse a atleta. Quando afirmou que havia vida além da ginástica, que estava lidando com demônios em sua cabeça e que precisava se concentrar em seu bem-estar, Simone Biles revelou sua dimensão humana. Simone Biles mostrou que falar de sofrimento psíquico não é uma fraqueza, mas um ato de coragem. Atletas são idealizados como seres que superam todas as adversidades – suportam dores físicas e lesões, submetem-se a treinos e disciplinas rigorosas.
- Quando uma pessoa extraordinária no que faz, como ela, grita para o mundo que não está dando mais conta, nos lembra que também lidamos o tempo todo com pressões.
- Sejam elas por desempenho, produtividade, sucesso ou quaisquer outras, inclusive àquelas relacionadas à imagem pessoal, aparência, corpo, vestuário, comportamento.
Isso leva a duras autocobranças na tentativa de atingir resultados, muitas vezes, inalcançáveis. O ideal impossível da perfeição traz sofrimento, reduz a autoestima, impacta a autoimagem. A consultora de imagem e estilo precisa se dar conta de que impor padrões idealizados pode afetar a saúde mental da cliente.
- Em vez de uma de identidade visual autêntica, que gere mais bem-estar, corre o risco de oferecer propostas que causam desconforto e inadequação da cliente com a própria aparência. Ninguém é imune aos revesses da vida.
Conduzimos a consultoria de imagem para dar mais conforto à cliente com sua imagem?
Toda pessoa está sujeita a momentos em que está mais ou menos fragilizada. Quando uma cliente contrata uma consultoria de imagem traz suas demandas e dificuldades. E quer soluções. Mudança de carreira, perda de emprego, separação, aposentadoria, adequação de dresscode, adequação de estilo. São muitas, e sempre singulares, as razões para procurar nosso trabalho, o que inclui insatisfações com aparência, corpo, rosto, cabelo.
- A pesquisa Real Verdade Sobre Beleza revelou que apenas 4% das mulheres em todo o mundo se acham belas, enquanto 54% afirmaram que elas mesmas são as que mais se criticam no que se refere a aparência.
- O estudo, que ouviu mulheres de 18 a 64 anos em vinte países, mostrou também que 80% das entrevistadas não enxergam a própria beleza, por conta de padrões estéticos idealizados, mesmo considerando que toda mulher tem algo de bonito em si.
O modo como conduzimos nosso trabalho na consultoria de imagem pode trazer benefícios para a cliente, fazendo uma boa diferença na vida da pessoa. Para isso, precisamos estar sempre atentas para não reforçar ideais estéticos e de imagem inalcançáveis, ainda tão presentes na nossa cultura. Você já se perguntou se não está desenvolvendo práticas que muitas vezes mais adoecem do que ajudam sua cliente?
As buscas por artifícios para nos tornamos mais próximos dos ditos padrões de beleza, que não cabem na vida real, causam frustração e podem afetar a autoestima, que é uma construção complexa. Ninguém tem uma autoestima inquebrantável! Toda pessoa tem dificuldades e questões internas que afetam em maior ou menor grau o gostar de si e todo mundo tem uma questão com a imagem, o que independe de aparência, corpo, idade.
Humanizar o processo é não desconhecer as necessidades da cliente
Não dá mais para a consultora de imagem trabalhar desconhecendo ou ignorando necessidades e desejos da cliente. Ou seja, cada vez mais o profissional deve investir em processos humanizados de atendimento, uma exigência reforçada pelo contexto da pós-pandemia, que felizmente, parece mais perto. Entender como a escalada da Covid19 impactou, e ainda impacta nossas emoções, é muito importante, já que a percepção de imagem, ou a autoimagem, tende a ficar exacerbada, e quando negativa vai afetar mais ainda a vida da pessoa. Muito importante redobrar nossa atenção na lida com a cliente, ressignificando a tão falada humanização do atendimento.
- Colocar palavras na boca da cliente
- Criar uma associação entre suas falas (sem que ela tenha feito isso).
- Adiantar diagnósticos sobre o que ela busca na consultoria de imagem.
- Adotar narrativas automatizadas de autoaceitação, não aceitar suas queixas e desconfortos, romantizado suas questões de imagem com uma positividade tóxica, são algumas das condutas que podem afetar emocionalmente a cliente.
VOCÊ JÁ SE PERGUNTOU SOBRE ISSO?
- Como lidar com os impactos na saúde mental na nossa vida e na de nossos clientes da consultoria de imagem?
- Como dar relevância ao nosso trabalho, que trata de imagem, aparência, comportamento e identidade visual diante de um mundo com mudanças tão profundas, aceleradas pela pandemia
- Como gerar benefícios para nosso cliente e evitar que a consultoria de imagem não se transforme em mais um elemento que comprometa a saúde mental?
Quem é a protagonista do seu processo de atendimento?
Os limites para lidar com pressões são sempre pessoais, mas a consultoria de imagem pode colaborar muito quando coloca a cliente como protagonista do processo. Em artigo no FFW, Camila Yahn falou sobre saúde mental na moda ao refletir sobre os aprendizados que a atleta Simone Biles deixou como legado das Olimpíadas de Tóquio.
Em seu texto, ela diz que “a moda está intrinsicamente ligada à saúde mental, pois ela acaba afetando a forma como nos percebemos e como os outros nos percebem”. E alerta que sendo a moda uma indústria historicamente excludente, mexe com a autoestima das pessoas, lembrando de talentos como Alexander McQueen, que desmoronou em meio a uma pressão sistêmica e insuportável. O estilista britânico, um gênio criativo, se matou em fevereiro de 2010, aos 41 anos de idade.
Assim como a jornalista, considero que a consultoria de imagem pode atuar para romper com tabus, dogmas e estigmas envolvendo aparência e imagem pessoal. A diversidade de corpos, rostos, idade, raças já se anuncia um caminho sem volta. Insistir em padronizar pessoas, adequá-las a modelos estéticos, desconsiderar seus desejos, assim como suas vulnerabilidades, é colaborar para desajustes, afetando sua autoestima.
Adotamos ferramentas para coloração, visagismo, guarda-roupa, estilo, marca pessoal, mas a expertise técnica não dá conta sozinha de propor uma expressão visual autêntica. O aprendizado e domínio de ferramentas genuinamente humanzidas preenche as lacunas deixadas pela técnica. Sem desenvolver as habilidades para entender mais a fundo a cliente, o profissional de imagem vai continuar um passo atrás no mercado.
Método Interno Estilo ensina a lidar com os impasse de imagem da cliente
Quando criei o método Interno Estilo me voltei para a formação prática dos consultores de imagem. A metodologia tem como foco o cliente, razão de ser do trabalho, que sustenta a humanização do atendimento. Impasses relacionados à aparência, percepção de autoimagem, dificuldades de se alterar padrões estéticos, relação consultor de imagem/cliente são algumas das questões que atravessam o dia a dia do profissional. Como lidar com elas? As ferramentas da escuta, a personalização de entrevistas e o aprendizado sobre os aspectos inconscientes que permeiam as escolhas de imagem são essenciais para conhecer o cliente e suas necessidades de imagem.
Acredito, e falo isso para as alunas dos meus cursos, que um trabalho bem-sucedido de consultoria de imagem passa longe de o cliente tornar-se uma réplica do consultor. Passa longe de o consultor ser idolatrado pelo cliente. Confira na sequência sete pontos importantes para humanizar seus processos de trabalho, lembrando que quanto mais investe em seu autoconhecimento, mais o profissional dá conta de escutar sua cliente, lidando com os matizes do comportamento humano.
- Um consultor de imagem que pratica a humanização respeita seu cliente e jamais faz conjeturas sobre ele.
- Um bom consultor é aquele que consegue apreender qual é a real demanda do cliente.
- O profissional não deve nunca ficar incentivando seu cliente a buscar uma imagem ideal, que sabidamente é inatingível e nada tem de autêntica.
- Importante é que o consultor deixe sua vaidade de lado e não tente ser um modelo a ser copiado pelo cliente. Este é um risco que o profissional corre, mas que pode e deve ser evitado.
- Cabe ao consultor ser também autêntico e verdadeiro sobre sua própria imagem, sem tentar se adaptar a qualquer idealização do cliente sobre ele.
- É o cliente quem sabe sobre a imagem dele, mesmo que desconheça esse fato.
- O consultor de imagem jamais deve fazer um julgamento sobre a imagem do cliente ou da fala do cliente sobre sua imagem.